EXCEÇÕES DE NOEL.
A vida tem dessas coisas. Houve um tempo quando milhões, bilhões e trilhões, eram apenas utilizados para contar as estrelas. Eram marcas fantásticas na observação do desconhecido. Os poetas sempre se deleitavam com noites assim porque, dessa forma, teriam a matéria prima ideal para dar forças às nossas imaginações e às nossas questões existenciais. Hoje é diferente. As coisas mudaram, os números são regras postas nas marcas corruptas da nossa natureza e do quanto podemos explorar, mentir e enganar nossos irmãos sem nenhum complexo de culpa, afinal... ?o mundo é dos espertos?, como a boa e velha brasilidade costuma dizer.
As coisas nem sempre foram assim. Ainda me lembro dos meus tempos de garoto. Ah, lá se vão seis décadas, nunca imaginei que meus 60 anos seriam assim: saudosos. Doces lembranças! Final de ano sempre foi o TUDO dentro da exceção. Dia 24, como se costuma dizer, era tempo de reunião e principalmente, reflexão. Fazíamos tudo diferente: nunca nenhum pai precisava nos mandar, fulano pega aquilo e leva aquilo outro; beltrano você não vai ajudar não? Havia espaço e estranhamente, naquele dia, todos sabiam bem as suas. Naquele tempo peru morria de véspera.
Engraçado... Não saberia dizer o porquê, mas fazíamos com prazer. Não pela obrigação de agradar pai e mãe, tio ou tia, avô, avó, primos mais velhos, sogro e sogra, até cunhado entrava na dança. Coisas de família. Não sabíamos direito, mas ainda garoto presenciava o bom e velho espírito de Natal.
Agora, quando olho para as ceias mais chiques, como poderia dizer, vejo o quanto o Natal mudou. Shoppings, Brooksfield, Hi-happy, Americanas, Notebooks, tem para todos os gostos, tudo é inglês... éh? Santa misericórdia! Como encontrar alguém num mundo desses desencontros? Não encontramos ?nós mesmos?, somos carentes de si, de amor. Tudo é biodegradável, descartável, é pegar e jogar fora, muitas vezes até o sentimento é volúvel?
Talvez por isso, Xuxa, Roberto Carlos e Faustão façam parte no final de ano de tantas famílias. São eles quem nos parabenizam pela data. Até a contagem regressiva de passagem de ano é feita por esses nossos heróis, afinal, não podemos nos esquecer, o ano novo também está ae. Cidra neles!
Cidra? Sim! Ninguém ligava com essa tal coisa de marca. Chandom ou Cereser... tava valendo! Antigamente tudo era diferente. Brincávamos, zoávamos com o natal, no natal e até mesmo do Natal; que nosso querido pintor e amigo, Cabo Natal, nos perdoe. A escrita da cartinha de final de ano, outro evento de época, sempre foi outra comédia, ora... não era ela nossa porta-voz junto ao bom velhinho? Mentíamos descaradamente, ?éramos bons garotos?, ?fazíamos tarefas todos dias?, ?bla-bla-bla-bla-bla?. Acreditávamos naquilo tudo? Nós tínhamos de dizer sempre as mesmas mentiras de final de ano, pois na verdade, sabíamos: esses pecadilhos seriam perdoados pelo homem do trenó.
Menos uma! Ainda me lembro da tentativa inútil de meu pai ao justificar a pisada de bola de Papai Noel comigo. Ele gaguejava ao dar explicações, e teimo em dizer... esfarrapadas, sobre os reais motivos do velhinho não ter me dado toda a coleção dos Comandos em Ação. Nem era tanto! Ela completa tinha apenas uns 100 ?ominhos?. E o pior: vem me dizer que tinha greve nas lojas dos Correios no Pólo Norte? Santa Inocência!
Cá estou hoje, 60º ano passado, 60ª noite de Natal. Mais uma vez vejo que tudo mudou mesmo nada tendo mudado. Temos um típico jantar do século 21, as marcas de um mundo moderno, contemporâneo e hi-tek.
Mas, engraçado! Também presencio coisas daquele tempo antigo de criança. Não precisamos das grandes marcas. A Sadia que nos perdoe, mas nosso porco, mesmo queimado, é melhor que o deles; nosso ?mousse?, mesmo com a tigela trincada tem seu charme; nosso pudim, mesmo sem aquela decoração brilhante dos grandes chefs, é tudo de bom; e, nosso grão de bico, mesmo com um cozimento duvidoso, marca sua presença.
2008 já se foi, mas ainda é e há tempo de celebrarmos a vida, Natal é isso. É re-nas-ci-men-to! É viver e reviver o que nos faz melhor. Ainda sinto os mesmos, antigos e emocionados olhares; a mesma respiração apertada quando tocamos nas mãos do outro e lembramos de quem somos, nossas raízes, nossas histórias, nosso sangue; Ahhh, como eu queria gritar bem forte o quanto os amo e sinto vontade de estarmos juntos, só mais uma vez... e mais uma... e mais uma, mais uma.
Papai Noel existe, vem do Pólo Norte, tem muitas renas, inclusive uma tem nariz vermelho e também tem uma risada ótima: ho ho ho ho!
Feliz Natal!
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